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  • Foto do escritorRicardo R. G. Albuquerque

O Grande Segredo das Estatísticas


Sergio Roberto Bichara/Freeimages

Em recente artigo para o site Unherd, o escritor Tom Chivers confessa que tem um critério simples para lidar com números e percentuais divulgadas pela mídia: se uma estatística é interessante, provavelmente não é verdadeira. Em sua resenha do livro The Art of Statistics: Learning from Data, de David Spiegelhalter, ele destaca que o autor corrobora a sua crença, ao afirmar que em geral as estatísticas divulgadas pela mídia passam por tantos filtros que acabam por ser distorcidas.


De forma irônica, Spiegelhalter aplica um princípio derivado da famosa piada de Groucho Marx, que jamais aceitaria fazer parte de um clube que o aceitasse como sócio. Ou seja, para se tornar atraente para o público, em geral uma estatística precisa ser simplificada de tal forma que muitas vezes perde o sentido e, além disso, em muitos casos oferece uma visão incorreta da realidade.


O artigo cita alguns exemplos complexos de como estatísticas podem ser ilusórias, caso interpretadas incorretamente, mas para aqui vamos nos ater a alguns exemplos mais simples. Um dos truques para tornar uma estatística mais chamativa é selecionar um percentual. Chivers cita o caso de notícias segundo as quais teria havido uma elevação de 83% na taxa de suicídios de crianças e jovens do sexo feminino na Grã-Bretanha em 2018. Embora o percentual seja aparentemente alarmante, ele surgiu a partir da seleção do ano com menor número de suicídios.


Outra técnica é utilizar números isolados, que parecem elevados a princípio mas não são estatisticamente relevantes. Um exemplo é dizer que X pessoas morreram de uma doença, um número que pode parecer elevado por si próprio, mas não em relação à população total. Posso citar também um exemplo recente: entrevistada sobre o aumento de casos de dengue, uma especialista esclareceu que se trata do ciclo natural da doença, não uma condição excepcional.


O dilema dos títulos


Quem trabalha com edição sabe o quanto um número facilita a tarefa de elaborar um título. Quase sempre é ele que irá chamar a atenção do leitor e, devido às restrições de espaço (ou ao próprio hábito, já que em publicações online, por exemplo, não há limites na quantidade de toques), é necessário simplificar ao máximo. Na prática, confia-se que o leitor irá ser esclarecido a respeito dos fatos no texto, mas vamos reconhecer que nem sempre isso acontece.


Números e estatísticas também são um drama para assessores de imprensa, em especial quem trabalha em áreas muito técnicas. Trabalhei muitos anos na área ambiental e uma de minhas tarefas era constantemente acalmar técnicos preocupados com o uso incorreto dos seus dados pelos jornalistas. Existem áreas, como o monitoramento da qualidade do ar, por exemplo, envoltas em tantos dados técnicos que seu uso na divulgação torna-se virtualmente inútil.


O fato é que, ironicamente, a grande abundância de informação disponível de certa forma a desvaloriza e a torna objeto de desconfiança. Não é para menos que uma das grandes novidades da comunicação nos últimos anos são as agências de checagem de dados, que tentam desvendar a realidade em meio à guerra de informação travada entre agentes públicos e privados. Além disso, a mídia tem sido mais cuidadosa e, mesmo quando há restrições técnicas de espaço ou tempo, como é o caso dos jornais impressos, TV e rádio, procuram complementar a informação por meio da internet.

(Publicado originalmente no LinkedIn em 21 de setembro de 2019)

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